Redução de vazão no ‘Velho Chico’ prejudica ecossistema e economia local

Seca no Sul e Sudeste compromete a geração de energia, por isso, sistema nos reservatórios do Nordeste foram reduzidos.

A redução de vazão no Rio São Francisco está prejudicando o ecossistema e a economia local. O motivo é que a situação crítica dos reservatórios do Sul e Sudeste por causa da seca fez com que a vazão do Velho Chico diminuísse.

A Usina Hidrelétrica de Sobradinho, na Bahia, regula as vazões do Rio São Francisco até a Foz. Atualmente, a represa da Chesf, subsidiária da Eletrobras, está operando com 58% da capacidade de armazenamento e vazão de 1.000 m³/s e 23% menor do que a vazão mínima aceitável, que é de 1.300 m³/s.

A situação é melhor do que em 2015, quando o lago ficou com 2% do seu volume útil. Na época, o impacto na irrigação foi enorme. As fazendas de produção de frutas foram forçadas a racionar água e, duas vezes por semana, todo o sistema de irrigação era desligado.

Já o setor elétrico não sentiu tanto porque as represas do Sul e Sudeste tinham água suficiente para atender a necessidade de geração de energia para o Sistema Interligado Nacional (SIN).

Este ano é diferente: Sul e Sudeste, além do Centro-oeste, enfrentam uma seca que compromete a geração de energia. E é por isso que o operador nacional do sistema decidiu reduzir as vazões nos reservatórios do nordeste.

O objetivo do ONS é aumentar o estoque de água, para utilizar gradativamente até o final do período seco, em outubro. enquanto isso, a região nordeste vai contribuindo com a geração de energia eólica.

A economia região do Vale do São Francisco é movida por água e energia. O setor de fruticultura irrigada emprega um 1.200.00 pessoas e produz mais de um milhão de toneladas de frutas por ano, grande parte exportada.

Os produtores temem que falte água para manter toda essa cadeia produtiva. “Hoje a prioridade dessa barragem é produzir energia. Então nós precisamos estudar um pouco melhor essa priorização, pra que não falte energia mas também não falte água pra irrigação”, explicou o gerente executivo da Associação dos Produtores e Exportadores de Hortigranjeiros e Derivados do Vale do São Francisco, Tácio Lustosa Silva Gomes.

A crise hídrica também preocupa porque a conta de luz das empresas dispara. “Há uma preocupação até porque esse custo de energia lá na frente vai impactar no preço da fruta pra o consumidor, na ponta final, né? E também vai ficar aqui pro produtor”, observou o agrônomo Emerson Costa Oliveira.

Abastecimento comprometido

O Velho Chico abastece grandes cidades, como Petrolina, em Pernambuco, e Juazeiro, na Bahia, que juntas têm quase 500 mil habitantes. E ainda tem que abastecer os dois canais da transposição que levam água para o Ceará e Paraíba.

Os problemas causados pelo represamento da água são visíveis a partir da hidrelétrica de Xingó, entre Alagoas e Sergipe, que está com vazão de 800 m³/s.

Pouca água e muitas pedras assustam

Pescadores estão preocupados. “É que esse rio dentro em breve, ele não possa ser mais navegável, a gente não possa mais captar água, a gente não possa mais pescar. A pescaria hoje já é muito difícil. E só pensando na geração de energia, esse futuro que nós acharmos tão distante, ele cada dia mais fica tão próximo”, lamentou o pescador Messias dos Santos.

A 30 quilômetros da Foz, o Velho Chico fica mais largo, raso e sem força. Um espelho d’água cheio de bancos de areia.

“Na maré seca, meu amigo, tá difícil de trabalhar aqui, viu? Tá muito difícil, muito assoreado, muito banco de areia e a gente realmente tem que ter habilidade pra conduzir a embarcação, se não acontece o que aconteceu com a gente aqui agora há pouco”, disse o empreendedor Fernando Peixoto Regueira.

Ecossistema fica comprometido

A qualidade da água piora a cada redução de vazão. Essa situação foi comprovada por coletas e análises da Universidade Federal de Alagoas (Ufal).

“A situação interfere no abastecimento, na reprodução das espécies, na intrusão salina que avança em direção ao continente, no abastecimento das cidades, porque gera uma qualidade de água pior, ruim, e se gasta muito mais para tratá-la”, disse o pesquisador da Ufal Emerson Soares.

Segundo o Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco, a vazão reduzida para priorizar a geração de energia compromete todo o ecossistema.

“O São Francisco com o aumento da população barranqueira, com as questões econômicas, com a exploração, tudo isso, o rio vem sofrendo. Nós não sabemos a que ponto vai chegar essa responsabilidade do São Francisco com a geração de energia para o país, né?”, disse o ambientalista Jackson Borges.

Por Amorim Neto, G1/AL