O Ministério Público Estadual de Alagoas (MPE/AL) requereu e o Poder Judiciário deferiu: estão bloqueados R$ 5 milhões das contas das faculdades Desenvolvimento e Integração Regional (Fadire), Anchieta do Recife (FAR), Santo Augusto (Faisa), Excelência (Faex) e do Instituto de Educação e Tecnologias (INET). A medida judicial foi acatada após a 1ª e a 2ª Promotorias de Justiça de União dos Palmares ajuizarem uma ação civil pública contra essas instituições, no último mês de março. Todas são acusadas de lesar centenas de estudantes ao não emitirem diplomas de conclusão de curso.
Na petição, os promotores de justiça Carlos Davi Lopes e Adilza Inácio de Freitas alegaram que as cinco faculdadesfazem exploração irregular de serviços educacionais, o que terminou causando um prejuízo milionário para uma grande quantidade de universitários daquele município. E, segundo eles, a ação civil pública tem justamente o objetivo de conseguir reparar os danos materiais e morais causados às vítimas.
“Essas unidades de ensino ofertam irregularmente cursos de graduação de Pedagogia e Administração de Empresas no município de União dos Palmares/AL, ou seja, sem o devido credenciamento e autorização do Ministério da Educação (MEC), mediante posterior validação de certificado por Instituição de Educação Superior diversa, devidamente credenciada, valendo-se de estratagema que tenta dar aparência de legalidade a tais operações e se esquivando da fiscalização governamental levada a efeito pelo governo federal”, diz um trecho da ação.
“O agir dos demandados ofende diretamente a concreção do direito fundamental à educação (CFRB, art. 6º), além de constituir prática abusiva em relação aos consumidores (inclusive os potenciais), cenário que evidencia a necessidade de intervenção do Poder Judiciário para fazer cessar tais ilicitudes. Por isso, a ação é dirigida a ressarcir os consumidores ludibriados pelas práticas enganosas”, argumentam os promotores.
A decisão favorável
Em sua decisão, a juíza Soraya Maranhão, da 1ª Vara de União dos Palmares, acatou os argumentos apresentados porCarlos Davi Lopes e Adilza Inácio de Freitas. Segundo a magistrada, a legislação até permite que os centros universitários e as universidades solicitem credenciamento de campus fora da sua sede, desde que o município esteja localizado no mesmo estado dessa sede. “Mesmo que a demandada possuísse credenciamento em sua sede à época das matrículas dos alunos, denota-se que a sucursal de União dos Palmares não estaria acobertada para a expedição dos certificados, pois estaria diante de clara afronta aos ditames normativos”, destacou ela.
Para a juíza, os estudantes saíram prejudicados por concluírem os cursos e não receberem seus diplomas e, exatamente em razão disso, o valor foi bloqueado para garantir que o patrimônio das instituições não seja dilapidado e que os alunos não fiquem impossibilitados de receber possíveis indenizações.
A novela para concluir os cursos
De acordo com as investigações do Ministério Público, no segundo semestre de 2013, o então secretário de Educação de União dos Palmares anunciou aos munícipes a chegada de uma instituição de ensino superior na cidade, que ofertaria os cursos de graduação de Pedagogia e Administração de Empresas, por meio da Faculdade de Desenvolvimento e Integração Regional (Fadire). Em razão desse comunicado, várias pessoas se interessaram pelos cursos, sobretudo pela facilidade de estudar no próprio município e pelo razoável custo das mensalidades, fixadas no início em R$ 156,00.
“O sonho de possuir um diploma em curso superior estava correndo bem. Mas, ao transcurso de cinco períodos, os alunos foram surpreendidos com uma matéria veiculada num jornal que relatava irregularidades no credenciamento para oferecimento de graduação fora da sede de várias instituições, e uma das quais era a Fadire. Vale asseverar que essa Fadire era mantida pela Sociedade de Desenvolvimento do Ensino Superior do Vale do Capibaribe (Sodecap) LTDA – EPP, sediada em Pernambuco, e conforme informações colhidas no Portal e-MEC, ela não possuía autorização para oferecimento de graduação fora da cidade de origem, o que resultou em seu descredenciamento pelo Ministério da Educação em 17 de outubro de 2018, por meio da Portaria 692, em virtude das irregularidades cometidas na disponibilização de curso superior em localidade distinta de Santa Cruz do Capibaribe, interior pernambucano”, detalharam os promotores na ação.
Após esse descredenciamento, uma nova instituição se disponibilizou a receber os alunos de União dos Palmares: a FAR – Faculdade Anchieta do Recife. Porém, receosos da problemática com a Fadire, os alunos procuraram a Promotoria de Justiça de União dos Palmares, narrando os fatos e pedindo que o Ministério Público interviesse, a fim de terem maiores garantias na expedição do diploma pela nova faculdade. E o MPE/AL tentou garantir esse direito, tendo celebrado, em 3 de fevereiro de 2016, um termo de compromisso entre a OESA – Organização de Ensino Superior Anchieta que mantinha a FAR e o Ministério Público de Alagoas. No documento, a instituição se comprometeu a receber os alunos e a expedir os diplomas ao término do curso.
“Entretanto, não passava da mesma fraude cometida pela Fadire, consistente no oferecimento de curso de graduação fora do local da sede, em claro desrespeito à normativa do MEC. Sem falar que as instituições não mantinham qualquer estrutura física ou de apoio aos usuários de seus serviços em União dos Palmares, sempre indicando um representante da própria cidade para dialogar com os alunos”, revelou a ação civil pública.
“Ao término do penúltimo período, o senhor Gedalias Pereira de Lima Filho informou aos alunos que a Faculdade Anchieta do Recife não poderia concluir a graduação, argumentando que ela já tinha atingido o número máximo de certificados de conclusão de curso autorizados pelo MEC. Nessa linha, esse mesmo representante da instituição obrigou os alunos de Pedagogia a migrarem para o Instituto de Educação e Tecnologias – INET, localizado em Salvador/BA, enquanto os alunos de Administração foram obrigados a ir para a Faculdade Santo Augusto – Faisa, cuja sede é em Santo Augusto/RS. Após essa nova troca, os alunos cursaram o último período com as supramencionadas instituições e fizeram colação de grau e festa de formatura”, contaram os promotores.
Entretanto, já depois da colação de grau, os estudantes tiveram outra ingrata surpresa. O certificado de conclusão de curso e histórico escolar das disciplinas foram emitidos pela Faculdade Kurios – FAK, atualmente nominada de Faculdade Excelência – FAEX, mantida pelo Instituto Cristão de Desenvolvimento Humano LTDA, localizada em Maranguape/CE, que também não pode expedir diplomas fora de sua sede. “Ou seja, as instituições de ensino deram um verdadeiro golpe nos alunos, frustrando sonhos e expectativas de uma vida melhor. Escolheram pobres cidades do interior alagoano e pessoas humildes para alimentar o desejo do diploma durante cinco anos. O sofrimento psicológico imposto a esses estudantes é inestimável, não se olvidando das privações materiais a quem foram submetidos para conseguir honrar as mensalidades”, argumenta a ação do Ministério Público.
“Nenhum aluno conseguiu diploma de conclusão de curso, muitos deles já estão empregados na área em que se formaram, outros já estão finalizando cursos de pós-graduação. Por isso, faz-se necessário, pois, uma rápida intervenção do Poder Judiciário, a fim de garantir a reparação dos danos suportados pelos alunos, sendo esse o objeto da presente ação”, alegaram Carlos Davi Lopes e Adilza Inácio de Freitas.
Bloqueio de bens
Para garantir o ressarcimento em danos morais e materiais sofridos pelos estudantes, o Ministério Público de Alagoas requereu, em março último, o bloqueio de R$ 5 milhões das contas das cinco faculdades acusadas de aplicar o golpe.
“Queremos a condenação dos réus, nos termos do art. 95 do Código de Defesa do Consumidor, ao ressarcimento dos danos materiais sofridos pelos alunos matriculados nos cursos de Pedagogia e Administração ofertados pelos réus na cidade de União dos Palmares, consistentes na totalidade dos todos os valores pagos, individualmente, pelos estudantes matriculados, referentes à matrícula, taxas e mensalidades, com a devida correção monetária. E ademais, o ressarcimento dos danos morais sofridos, no mesmo valor dos danos materiais apurados, de forma cumulativa”, explicaram os autores da ação civil pública.
As investigações das 1ª e 2ª Promotorias de Justiça de União dos Palmares contaram com o apoio do Núcleo de Defesa da Educação do MPE/AL.
Assessoria MPE/AL