As novas cores das zebras

Quem gosta de futebol sabe que não existem certezas. Muitas vezes surpresas acontecem e favoritos caem diante de times de menor expressão. Mas, ainda assim, existem favoritos. E ao longo das décadas, nos acostumamos com alguns nomes que quando postos em um embate aparecem como prováveis vencedores.

Porém, algo vem mudando no futebol brasileiro. Times tradicionais, de grande expressão, têm cada vez mais lutado para manter-se fortes e na primeira divisão, nem sempre com sucesso. Por outro lado, times de porte médio, fora dos grandes centros, têm ganhado protagonismo, com campanhas consistentes e inéditas participações em torneio continentais.

Há dez anos, quem seria favorito em um Cruzeiro x Fortaleza? Vasco x América Mineiro? Grêmio x Bragantino? A grande maioria dos fãs marcaria a primeira coluna. Mas hoje, com a nova ordem do futebol, talvez a melhor aposta fosse a segunda coluna ou no mínimo coluna do meio. Afinal, Fortaleza, América e Bragantino foram para a Libertadores enquanto o Cruzeiro, Vasco e Grêmio estão na segunda divisão.

O conceito de time grande

O que faz a grandeza de um clube é uma mistura de sua história com seus resultados recentes. Conforme um time se distancia das vitórias, das conquistas de campeonatos e das grandes premiações, restam apenas as glórias do passado, uma torcida exigente e uma contabilidade que não fecha.

Por outro lado, há times que têm trilhado o caminho do desenvolvimento, com austeridade nas contratações, procura por profissionais modernos e capacitados e uma trajetória nova que faz com que ainda que o sonho de um campeonato nacional pareça distante, ele não seja mais impossível.

Na realidade, o simples fato de obter melhores resultados aumenta as premiações e a capacidade de reinvestir no clube, criando um círculo virtuoso que resulta em consistência.

Alguns bons exemplos têm vindo do Nordeste. O Fortaleza apostou em trabalhos de longo prazo, primeiro com Rogério Ceni e depois com Vojvoda, esse último uma escolha de risco que se provou extremamente eficiente.

Em 2021, mesmo após uma sequência ruim de seis jogos sem vitória, o técnico foi prestigiado e levou o Leão do Pici a sua primeira Libertadores. O rival Ceará não chegou ao mesmo torneio por muito pouco, mas conseguiu acesso à Sul-americana, o que já garante um bom aporte aos cofres alvinegros em 2022.

O Bragantino seguiu outro rumo, fechando uma parceria com uma famosa marca de energéticos, o que garantiu aportes financeiros, uma profissionalização da estrutura do clube e um saudável intercâmbio com diversas outras equipes que a Red Bull mantém ao redor do mundo.

Novos caminhos sendo trilhados

Aparentemente a maioria dos clubes já percebeu que o mundo mudou e que eles precisam mudar também. Alguns já tomaram a iniciativa de buscar soluções, principalmente através das Sociedades Anônimas de Futebol, mais conhecidas como SAF.

Essa nova figura jurídica permite que os clubes vendam parte de seus departamentos de futebol, algo que garante aportes financeiros e repasses de dívidas, alivia as contas do clube e permite um verdadeiro novo nível de profissionalismo na gestão do time.

Como toda nova ideia, a SAF ainda precisa passar pelo teste de realidade do futebol brasileiro. Mas Cruzeiro e Botafogo já criaram – e venderam – suas SAF com sucesso. Resta saber se será suficiente para devolver a esses dois grandes clubes a condição de favoritos ou se eles continuarão encarnando o papel de zebras.

A verdade é que as zebras são parte inerente e divertida do futebol, e não são exclusividade brasileira. A Inglaterra já protagonizou algumas das maiores zebras da história, e não falamos de uma simples partida perdida na tabela, ou de uma queda inesperada em mata-mata. Falamos de um campeonato inteiro, com o surpreendente Leicester vencedor da temporada 2015-16. Foram 38 rodadas com o mundo esperando que ele caísse e, no final, o time levantou a taça da Premier League.

Muitos acham que no Brasil nunca acontecerá algo desse tamanho. Mas assim como as zebras têm surgido com novas cores, também novas forças têm despontado. E quem um dia foi zebra, hoje pode ser candidato a título. Como já dissemos, no futebol não existem certezas. E surpresas (às vezes nem tão surpreendentes) acontecem.